O Rei em Joaçaba
Imagine se em tempos de redes sociais, e-mails, comunicação instantânea, desembarcasse por estes lados um artista como Roberto Carlos!
Imagine em tempos de redes sociais, e-mails, comunicação instantânea, se desembarcasse por estes lados um artista como Roberto Carlos. Qual seria o tamanho do furor que esta notícia causaria? Como seria a mobilização de fãs e da cidade e região? Com certeza seria algo histórico, mas o que muitos não sabem é que o Rei Roberto já esteve em Joaçaba. Foi no ano de 1967, quando tudo era muito diferente, a começar pelas gírias uma brasa mora.
Por aqui o Rei cantou em um palco improvisado e com a iluminação de veículo nos morros ao redor do estádio Oscar Rodrigues da Nova. Bom, nada melhor do que deixar quem viveu este momento bem de perto contar a história. Esse personagem é Antônio Carlos Bolinha Pereira, que entrevistou Roberto Carlos. No texto abaixo Bolinha conta o que aconteceu em Joaçaba naqueles dias.
Leia também:
30 anos da morte de Raul Seixas! Relembre o show do Maluco Beleza que parou Joaçaba
A história dos cinemas em Joaçaba
Roberto Carlos Cantou no Escuro
Em 1967 Roberto Carlos, então no auge da Jovem Guarda, apresentou-se em Joaçaba, no Estádio Municipal Oscar Rodrigues da Nova. O show entrou pra história de nossa Cidade, localizada no Meio Oeste de Santa Catarina, mas também foi marcante pro Rei: ele cantou no escuro.
Após o show, quando tentei entrevistá-lo, o Roberto atenciosamente convidou-me para conversarmos na manhã seguinte, pois ele ainda iria se apresentar em um baile no elegante Clube Dez de Maio. Roberto ficara hospedado na residência do Sr. Ivan Bonato, então presidente da Comissão Organizadora dos festejos comemorativos do Cinquentenário de Joaçaba, e o próprio anfitrião teria revelado que o empresário só liberou o Roberto pra fazer o show após receber TODO o valor do contrato, pois, segundo ele, estariam cansados de ter prejuízo com contratos que não eram pagos.
Quando, enfim, foi arrecadado o dinheiro suficiente pra cumprir o compromisso, já estava escurecendo, e o estádio não tinha iluminação na época.
Um impresso divulgava assim a atração:
23 - DOMINGO - ASSISTA, NO ESTÁDIO MUNICIPAL, MAIS UM PRÉLIO PELO ESTADUAL DE FUTEBOL ENTRE FERROVIÁRIO F.C. (Tubarão) x CRUZEIRO ATLÉTICO CLUBE (Joaçaba) e, em destaque, a chamada: DIA 22 - Sábado à Tarde O MAIOR CANTOR DE MÚSICA JOVEM R O B E R T O C A R L O S No Estádio Municipal Oscar da Nova - 15,30 horas
Para ajudar na venda de ingressos, um lembrete anunciava:
Já estava escuro, pois o show, marcado pro meio da tarde, só começou depois das seis horas, e em julho isso quer dizer noite escura em nossa região. O público estava impaciente pela demora, mas havia a certeza de que o show aconteceria, pois na chegada do avião ao Aeroporto Municipal praticamente toda a cidade estivera presente, para ver de perto a chegada do Roberto Carlos a Joaçaba. Assim, por causa do atraso, o Conjunto RC7 foi vaiado quando subiu ao improvisado palco, mas o artista principal foi aplaudidíssimo, mesmo cantando no escuro.
Procurando amenizar a situação, alguns carros apontavam seus faróis pra dentro do estádio - mas eles estavam distantes, no morro que leva ao Moinho do então prefeito Udilo Coppi, ali em frente da atual sede da Escola de Samba Aliança, e as luzes não ajudavam muito. Roberto iria embarcar às 8 da manhã do domingo, e desde as 7 horas eu já estava em frente da casa (hoje transformada no Consultório Médico CLINICOR, Clínica do Coração, dos cardiologistas Luis Antonio Cunha e Leonardo Fuga).
No peito o coração batendo apressado, e nas mãos um gravador emprestado pela rádio Herval d'Oeste e algumas revistas e capas de LP para serem autografadas, mais o compacto simples, com a gravação do Trio Esperança para A FESTA DO BOLINHA, (composição da dupla Roberto e Erasmo Carlos, que uso como prefixo de meu programa de rádio até hoje). O resto, bem o resto agora é história ... e quero partilhar com os amigos essa história, que a Revista do Sul de Blumenau, por seu diretor, Dr. Oséias, cometeu a gentileza de publicar ainda em 1967. Assim, virou matéria jornalística aquela “façanha” do menino de 16 anos que alcançou o sonho de entrevistar esta pessoa maravilhosa que nos acostumamos a chamar de REI.
E hoje, tantos anos passados, vejo com satisfação o reconhecimento do talento do Roberto pelas novas gerações, e suas canções continuarem agradando a muitos. por isso digo: SE A GENTE NÃO SE GAVAR, NEM O JUCA GAVA ... bão, chega de papo, vejam a entrevista, que também foi publicada no Clube do Rei: Abraços Antonio Carlos Bolinha Pereira
REVISTA DO SUL, (BLUMENAU, SC) NR. 183
O Rei chegou a Joaçaba por volta das 15:30 horas, do dia 22 de julho. Grande número de fãs já o esperava no Aeroporto Sta. Terezinha, e ele, ao desembarcar do avião especial da SADIA que o trouxera, acenou para as pessoas ali presentes.
Por motivos técnicos houve um certo atraso, e o show que começaria às 16 horas teve início somente às 17:45. O estádio estava lotado (calculada em 5.000 pessoas a afluência), mas poucas pessoas puderam vê-lo bem: é que o estádio não possui iluminação, mas mesmo assim, e apesar do frio que fazia no local, as fãs acompanharam o Rei em seus maiores sucessos: Mexericos da Candinha, Pega ladrão, Eu te adoro meu amor, Parei na contramão, Esqueça e outras, com o Calhambeque, em arranjo especial para encerrar o show.
À noite, apresentou-se no Clube 10 de Maio, e, domingo pela manhã concedeu-nos a entrevista, que é agora transcrita na Revista do Sul:
ENTREVISTA COM ROBERTO CARLOS, FEITA POR ANTONIO CARLOS PEREIRA (BOLINHA), NA RESIDÊNCIA DO DR. IVAN BONATO, EM 23/07/1967.
Bolinha - Oi turma, nós temos aqui, junto à reportagem da Rádio Herval dOeste, S. Majestade, o Rei da Jovem Música Brasileira, Roberto Carlos. Roberto, suas palavras iniciais...
Roberto Carlos - Ah, bem... inicialmente o meu abraço a todos, meus agradecimentos ao carinho que recebi aqui, e uma beijoca muito especial para as fãs. B - Roberto, você esteve no Festival de Veneza este mês?
RC- Foi.
B - E você ficou entre os seis colocados. O resultado sairá daqui a meio ano. Você concorreu com Namoradinha e Eu te darei o céu?
RC- Não.. Só Namoradinha,Eu te darei o céu faz parte do compacto, porém não foi apresentada ao público ao vivo
B - E você já vendeu quantos LPs de Namoradinha. Ou é compacto?
RC- É compacto. Na Itália não sei quanto eu vendi.
B - Ah, pensei que fosse por vendagem no Brasil... e lamento não ser italiano, residente lá, afim de colocá-lo em primeiro lugar.
RC- Ah, eu também!
B - Você vai gravar LP agora em agosto, ou só compacto?
RC - Compacto. Meu LP sairá só em dezembro.
B - Seu mais recente LP - o que tem Namoradinha foi apresentado por mim em primeira audição aqui no Estado. No mesmo mês - dezembro - entraram cinco músicas suas em minha Parada de Sucessos, feita com base nas solicitações.
RC- É... tá bom. Obrigado.
B - Em oito paradas, você tem: 6 primeiros lugares, 3 segundos e 2 terceiros e uma música sua em primeiro lugar, com Os Vips.
RC - Ah! O Faça alguma coisa pelo nosso amor e Meu grito como é que estão aqui?
B - O meu berro está indo bem... eu ainda não tinha e veio alguns dias atrás: toquei uma vez só e chegou ao 18º lugar. Neste mês ele deve melhorar muito. Eu peguei o seu endereço para mandar depois o resultado da Parada.
RC - Ok...OK...OK.
B - Outra pergunta: Por que Wanderléa nunca gravou música sua?
RC - Não, ela gravou uma, sim. É o Quilo de doce.
B - Mas, não chegou às Paradas?
RC - Não. Mas, geralmente quem escolhe o repertório da Wanderléa é o Seu Evandro, diretor da CBS. E nós temos, assim, pouco contato. Quando eu vou lá é para discutir sobre os meus discos e outros detalhes, e nunca se comenta sobre o repertório de Wanderléa, que ele escolhe muito bem.
B - Neste último LP, ela está se destacando com Prova de fogo. É do Erasmo, o meu amigo Super. RC - É... (risada)
B - Tem uma vez tremenda aqui também. Eu pego sempre a Jovem Guarda...
RC - É uma pena que não pega bem aqui a televisão.
B - Televisão não pega muito bem. Mas, mesmo assim, alguma coisa dá para a gente ver.
RC - O Bonato diz que vai sair uma campanha aí... (risada)
B - As músicas, Roberto, que vão sair em seu compacto, agora no mês de agosto, você já tem o nome?
RC - Tenho - Uma é Como é grande o meu amor por você que é uma música lenta, tipo Nossa canção. A outra é uma música que é inspirada no estilo daquelas Fugas de Bach, que tem o título Por isso estou aqui.
B - A Nossa canção pegou muito bem em Joaçaba: chegou ao 2º lugar.
RC - Ah!... sim, e...
B - Em primeiro lugar estava Namoradinha.
RC - (risada). Eu ia te perguntar que é que estava na frente da Nossa canção.
B - Pois é, você perdeu para você mesmo, mora.
RC - O.K. B - Como é grande o meu amor por você é autoria de quem?
RC- Minha. A outra, também.
B - Ah, então pegam o primeiro lugar, mora. Outra pergunta: O seu Jovem Guarda continua com grande audiência em São Paulo?
RC - Sim. Inclusive uma notinha numa Revista em São Paulo disse que meu programa teria parado no Rio por falta de patrocinador. É papo mais furado que já vi, porque o programa de audiência está ótimo e o patrocinador também continua. Além do mais, o programa não parou.
B - E sobre o seu casamento; é papo furadíssimo?
RC - É furado, sim.
B - Num mês saíram duas notícias sobre o seu casamento...
RC - Ah, saíram várias notícias sobre esse negócio de que eu ia casar. Mas, não casei, nem tinha intenção de casar. Não tinha nem noiva, quanto mais casar.
B - Do seu próximo LP você não sabe o nome das músicas?
RC - Do próximo Lp são músicas do filme. O filme sai em janeiro e o Lp em dezembro. Eu já tenho todas as músicas do filme. Só não sei o nome delas. Eu sei que uma se chama Corro demais, outra Não adianta nada, Quando, Eu faço o que quero...
B - No estilo da Namoradinha, tem alguma?
RC - Tem Quando. E tem o Corro demais que é de um estilo de música assim, pouco usado. Não é estilo de Namoradinha, nem estilo Quero que vá tudo pro inferno. É uma música que não é lenta, nem apressada. É uma música calma, mas que tem grandes possibilidades.
B - E... no ritmo de Quero que vá tudo pro inferno não tem nenhuma?
RC - Tem mais ou menos o Quando que é parecida com a Namoradinha... também.
B - Este seu filme será uma espécie de bang-bang, meio apressado?
RC - O título é Roberto Carlos em ritmo de aventura. E dentro do filme, eu, inclusive, falo com o Diretor, digo que vou sair do filme. Cenas assim, interessantes... Negócios com bandidos e metralhadoras, enfim, bem movimentado.
B - A outra pergunta é sobre Martinha: você acredita no sucesso de Martinha? Acha que ela pode barrar a Wanderléa?
RC - Bem esse negócio de barrar a Wanderléa não é bem o caso, porque nem mesmo existe uma concorrência entre Martinha e Wanderléa. Agora, ela poderá, dentro do estilo dela, conseguir um lugar de destaque. Ela geralmente grava o que compõe. É um estilo diferente.
B - O seu livro Roberto Carlos em prosa e verso está alcançando um grande índice de vendagem?
RC - Parece que eles não estão conseguindo prensar bastante para a venda...
B - E sobre o seu começo de carreira, foi difícil?
RC - Foi...
B - E o seu primeiro sucesso?
RC - Foi Splish splash. Meu primeiro sucesso nacional, porque eu já havia acontecido com outros discos, mas no Rio.
B - Uma pergunta meio fora; Mamãe mandou perguntar a você porque esse olhar tão triste?
RC - Bem, é porque eu nasci assim. (risada). Eu não sou propriamente triste. E aproveito para mandar, assim, um abraço muito carinhoso à sua Mamãe, viu?
B - Está, muito obrigado, Roberto. Então aos ouvintes do nosso Os discos do Bolinha, que não se despediram de Roberto Carlos, já que o avião deverá sair dentro de poucos minutos, sua despedida para Joaçaba...
RC - Muito obrigado a você, Bolinha... e aos ouvintes pela atenção; eu quero dizer que o carinho que recebi aqui dá vontade de voltar o mais depressa possível e não ir embora. Mas, de qualquer forma, eu tenho que ira hoje mesmo por causa da Jovem guarda, mas se Deus quiser em outra oportunidade, aqui voltarei para rever as fãs que nos aplaudiram e que nos trataram com grande carinho. Muito obrigado, um abração a todos, e até a próxima, se Deus quiser. Bye...
N. R. - Ao publicar a interessante entrevista concedida por Roberto Carlos a um menino bom, inteligente, que é o Bolinha, que tem um ótimo programa na Rádio Herval do Oeste, a nossa Revista, que penetra em todos os lares, vai de encontro ao modo de sentir de hoje da nossa juventude. Não somos adeptos do iê-iê-iê, nem o fazemos por mercantilismo. Pelo contrário, pertencemos à velha guarda. Mas, temos que viver a época e as minhas filhas apreciam Roberto Carlos, Ronnie Von... Os nosso leitores, principalmente os mais velhos, compreenderão e aplaudirão o nosso gosto. (Dr. Oséias Guimarães, REVISTA DO SUL, Blumenau SC, 1967)
Se você tem história legais sobre sua cidade envie pra gente neste link: https://www.ederluiz.com.vc/contato