Árvore gigante rara de 535 anos foi derrubada para virar cerca em Vargem Bonita
Imbuia era alta como um prédio de dez andares, larga a ponto de só poder ser abraçada por seis pessoas juntas.
Era alta como um prédio de dez andares, larga a ponto de só poder ser abraçada por seis pessoas juntas e mais antiga que a chegada do navegador Pedro Álvares Cabral ao Brasil.
Essa gigante imbuia, árvore símbolo de Santa Catarina, foi derrubada para virar cerca, segundo o cenário encontrado por policiais militares ambientais.
O crime ambiental foi cometido em um terreno na via Linha Coração, em Vargem Bonita (SC), em fevereiro de 2018, mas só agora uma análise ainda inédita apontou a idade da imbuia gigante: ao menos 535 anos.
É um problema cultural do nosso país, onde as pessoas não sabem o valor de uma árvore. Aquelas que caem por ação da natureza deveriam ser exploradas de forma mais nobre, virar peça de museu. Mas fazer uma derrubada de uma árvore rara saudável para fazer palanque de cerca é duplamente criminoso, afirmou o professor Marcelo Scipioni, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), especialista em árvores gigantes.
A idade foi estimada por Scipioni e outros dois pesquisadores a partir da análise dos anéis de crescimento das árvores, que servem de base para a datação por meio da ciência chamada dendrocronologia.
Como a umidade e outras variações climáticas interferem no tamanho desses anéis de um modo distinto ao longo do tempo, pesquisadores agora buscam outras imbuias antigas para uma análise de construção climática dos últimos séculos que permita determinar com mais exatidão a idade da árvore.
Essa árvore, de nome científico Ocotea porosa, pode ser encontrada em florestas de araucária no Paraná, no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina. A espécie tem madeira de cor que varia do pardo-claro-amarelado ao pardo-acastanhado, folhas de até 10 cm, casca grossa, tronco tortuoso e copa arredondada.
E, por causa da exploração desenfreada, entrou para a lista de espécies da flora brasileira ameaçadas de extinção.
Ou seja, são proibidos coleta, corte, transporte, armazenamento, manejo, beneficiamento e comercialização da imbuia, à exceção dos exemplares cultivados em plantios devidamente licenciados.
O policial militar ambiental Teylor Comunello, que dá nome a uma espécie de flor que descobriu em sua pesquisa sobre orquídeas, relata ter sentido tristeza ao ver árvores raras no chão — foram derrubadas uma imbuia e 16 araucárias.
Nunca tinha visto uma árvore assim, desse tamanho, cortada desse jeito. É bem triste porque, além de ser uma espécie ameaçada de extinção, é centenária e rara. Um desperdício, afirmou à reportagem. Ele participou do trabalho de remoção da árvore, que agora está exposta na sede da Polícia Ambiental para fins educativos.
O uso em cercas ocorre porque a madeira é bastante resistente a intempéries, e pode resistir no solo por nove anos, em média.
Comunello estima que no mercado ilegal o valor dessa imbuia poderia girar em torno de R$ 4 mil, caso fosse transformada em estaca de cerca, ou passar de R$ 20 mil se fosse vendida à indústria madeireira.
A madeira dessa árvore é moderadamente densa e pode ser usada no manejo autorizado como viga, porta e móveis finos de alta qualidade.
O valor de mercado poderia superar, portanto, a multa de R$ 12.750 aplicada ao proprietário do imóvel, em razão da derrubada desta árvore junto de outros 16 exemplares da também ameaçada araucária (Araucaria angustifolia, ou pinheiro-brasileiro).
Os agentes chegaram ao local do desmate ilegal após uma denúncia, mas não encontraram pessoas ou equipamentos ali. Nenhum suspeito foi identificado desde então.
Segundo a Polícia Ambiental de SC, a derrubada de árvores teria sido feita à revelia dos donos do terreno, mas estes acabaram multados por serem, em última instância, os responsáveis pela área. A recuperação ambiental do local começou em maio deste ano.